Coluna

Algozes e vítimas

Este mês lembramos os 50 anos de dois eventos que marcaram o fim dos anos 1960, para o bem e para o mal: o Festival de Woodstock, e os assassinatos cometidos pelo culto chefiado por Charles Manson. Enquanto um desperta uma certa nostalgia e idealismo, o outro é fonte de um fascínio macabro. 

A detalhada biografia de Jeff Guinn (Darkside, trad. Daniel Alves da Cruz) mostra como o mal pode ter origens extremamente banais. Guinn é um especialista, e escreveu também livros excelentes sobre Bonnie e Clyde, o tiroteio no O. K. Corral entre Wyatt Earp, Doc Holliday e a gangue dos irmãos Clanton, e sobre o suicídio coletivo da seita de Jim Jones.

Charles Manson veio de uma família conturbada, com um histórico não muito diferente de centenas de delinquentes juvenis. Era totalmente egoísta, mas também sabia ser carismático. Curiosamente, começou a moldar sua filosofia e seu culto a partir de dois livros que leu na prisão: o clássico da auto-ajuda “Como Fazer Amigos e Influenciar Pessoas”, de Dale Carnegie, e “Estranho Numa Terra Estranha”, o não menos clássico romance de ficção científica de Robert A. Heinlein, que fez sucesso na contracultura da época. Primeiro, usou os ensinamentos para atrair mulheres e explorá-las como prostitutas. Depois, ao mesmo tempo em que tentava se lançar como cantor/compositor, passou a reunir adeptos e formar o que chamou de “família”. A lavagem cerebral que praticou nos seguidores explodiu em duas noites de terror em Los Angeles, em que cinco pessoas foram assassinadas – entre elas a atriz Sharon Tate, então casada com o cineasta Roman Polanski. Ela estava grávida de oito meses e meio, e levou dezesseis facadas.

Tate e Polanski em A Dança dos Vampiros (1967)

Tate tinha poucos filmes no currículo, e acabou mais conhecida pela morte brutal do que pelo que fez em vida. Como vítima célebre, teve sua história também contada em vários livros, inclusive por Polanski. Mas lembrar das vítimas vítimas é a exceção, não a regra. Parece que nos fascina mais a mente perturbada dos assassinos. Manson morreu na prisão, mas de certa forma teve a fama que tanto queria. Os crimes são lembrados no novo filme de Quentin Tarantino, Era Uma Vez Em… Hollywood, que acaba de entrar em cartaz. Recentemente vimos também o ressurgimento do interesse pelo serial killer Ted Bundy em livros, documentários e um filme. 

Mas um livro lançado lá fora no começo do ano tenta reparar um pouco esse desequilíbrio, e lançar uma luz sobre as vidas das mulheres assassinadas pelo serial killer mais conhecido da história: Jack o Estripador. O mistério sobre a identidade do assassino gerou uma pequena indústria de livros. Mas o foco de The Five: The Untold Lives of the Women Killed by Jack the Ripper, de Hallie Rubenhold, são as mulheres que ele matou. As cinco são geralmente definidas simplesmente como prostitutas. Mas a pesquisa minuciosa da historiadora mostra que eram muito mais do que isso, e faz um retrato cruel do que era ser pobre e principalmente mulher na sociedade vitoriana, de um desenvolvimento acelerado a um alto custo social. Para Rubenhold, elas estavam no lugar errado na hora errada. Só levaram 130 anos para terem sua vez.

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