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As Viúvas (filme)

Não dá para reduzir o filme As Viúvas (Widows, EUA, 2018) apenas a um thriller, apesar de sua trama seguir por esse gênero, esse é um filme que precisa ser visto também nas entrelinhas. Ele começa com a desconstrução das mulheres que o protagonizam, elas não são masculinizadas para caberem em seus personagens, são mulheres comuns, com vidas comuns, lidando com casamento, filhos, dinheiro, família e que precisam se unir por pura sobrevivência. Passa pela crítica social ao mostrar políticos corruptos dos dois lados da moeda: o de família branca rica tradicional, com um legado antigo para manter na política e o negro do gueto, envolvido com a sociedade e também com o crime organizado, que decide ser vereador para manter sua impunidade.

Dirigido por Steve McQueen, o filme abre com Viola Davis e Liam Neeson, deitados em uma cama, beijando, em close, uma cena que Viola comentou como não sendo comum, por mais que as pessoas e o cinema atualmente se proclamem envolvidos com a inclusão e representatividade. Mas um filme que acontece em Chicago, que mostra várias facetas da mesma cidade, não pode mais ignorar a diversidade. E McQueen é bem lúcido em mostrar isso de forma bem natural, Viola Davis, Michelle Rodriguez, Elizabeth Debecki, Liam Neeson, Colin Farrell, Robert Duvall e Daneil Kaluuya, são alguns nomes que integram o elenco escolhido.

O filme é baseado em uma série de televisão dos anos 1980 que é baseada no livro de Lynda La Plante, que também roteirizou a série. Dessa vez a adaptação foi para as talentosas mãos de Gyllian Flynn, autora de thrillers que envolvem protagonistas femininas. A trama tem como base um assalto que não dá certo, onde todos os envolvidos são mortos durante uma emboscada, deixando para trás as esposas, Verônica (Viola), Linda (Rodriguez) e Alice (Debecki). O problema é que o alvo do assalto foi o chefe do crime organizado, Jamal Manning (Brian Tyree Henry), que também está concorrendo a vereador por um dos distritos mais pobres e violento de Chicago. Jamal decide ir atrás de Verônica, viúva de Harry Rawlins (Neeson), cabeça de todo o esquema que deu errado. Por pura questão de sobrevivência, Verônica decide entrar em contato com as outras viúvas e continuar o trabalho do marido para conseguir o dinheiro para pagar Jamal.

Verônica é representante do sindicato dos professores de Chicago e vive em um apartamento de alto nível que pertencia ao seu marido. Linda é dona de uma loja de vestidos e assessórios para festas de quinceñeras. Alice não tinha um trabalho e era sustentada por seu marido abusivo. Sem explicações moralistas, as três personagens, além da cabeleireira Belle O’Reilly (Cynthia Erivo), decidem seguir com o plano por puro instinto de sobrevivência. Nenhuma delas se se sente a vontade com isso, todas se mostram completamente apavoradas com a possibilidade de tudo dar errado mas ao mesmo tempo todas elas sabem que se elas não se unirem e se ajudarem mais ninguém irá. Dali não nasce uma incrível amizade e sentimento de irmandade entre elas, mas há um entendimento silencioso de que elas precisam permanecer juntas se quiserem passar por tudo aquilo sem perderem mais do que já perderam. Uma alegoria muito próxima a realidade de maioria das mulheres, que não precisam necessariamente participarem de um crime, mas que sabem que precisam se unir a outras dentro de situações extremas para poderem chegar ao outro lado com o mínimo de perda.

McQueen é co-roteirista do filme e ele pega uma trama que, apesar de partir de uma premissa inusitada, contém todos os elementos comuns a um thriller e os desconstrói. Nada é preto e branco, tudo é cinza, todas as situações e personagens não são fechados dentro de um estereotipo. É um filme de grandes interpretações, sem dúvida, que combina com a direção de McQueen. Mas Viola Davis brilha com facilidade, ela se destaca em todas as cenas que aparece, ela está pronta para a temporada de premiações e dessa vez como atriz principal.

As Viúvas é o filme que precisamos nesse momento, ele dialoga com o mundo que estamos vivendo, mas, acima de tudo, é um excelente thriller sobre a força das mulheres, sem ser condescendente ao debater o papel da mulher na sociedade da forma mais feminista possível. Sem fazer força nenhuma, esse é um filme que está pronto para ganhar prêmios, por direção, roteiro e melhor atriz. Agora é sentar e esperar, porque, sem dúvida, As Viúvas está entre os melhores filmes que você viu esse ano se não for o melhor.

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