Coluna

De perguntas, medo e imaginação

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Ao buscar o tema da coluna desse mês, pedi a um amigo que me fizesse uma pergunta, qualquer pergunta, para ver o que ela acordaria na minha mente. Acho curioso como a nossa cabeça funciona quando alguém nos pergunta alguma coisa. O atiçar de uma pergunta. Como se ela acionasse um mecanismo complicado, mas que, de alguma forma, ele decodificasse nossos pensamentos desordenados e conseguisse expelir uma resposta, muitas vezes criando mais perguntas.

A pergunta do meu amigo “Por que nós gostamos do Rick Sanchez?” me fez pensar na resposta “imaginativo”, o que me levou à “imaginação” e por sua vez a um diálogo do primeiro episódio de Hannibal, a série, em que uma personagem está conversando com o detetive e pergunta para ele “o que você acha que motiva o Will?”. O detetive responde “Medo”, ao que ela acrescenta “a imaginação cria o medo”. Esse diálogo me marcou porque lembro de na época ter conflitos com essa afirmação. Não discordava, porque é óbvio que quanto mais você abre portas para ilusões, mais medo entra por elas, no entanto, mais soluções também se apresentam. Você cria um monstro e, ao mesmo tempo, as armas para combatê-lo. Não é mais ou menos assim que acontece?

Como toda criança, eu já tive medo do escuro. Ficar sozinha na sala por algum motivo era diferente de ficar sozinha no quarto, eu me sentia desprotegida, e muitas vezes, quando era a última a sair, apagava a luz correndo, como se algo estivesse me perseguindo, e me jogava na cama, aliviada, depois de fechar a porta, porque afinal eu tinha vencido a corrida contra qualquer que fosse o monstro da minha imaginação. E pode ter certeza que eu imaginava muitas coisas.

Um bela noite, eu ainda era criança, resolvi enfrentar esse medo. Minha mãe e meu irmão já tinham ido dormir e a sala estava escura e povoada pelos perigos que eu inventava. Inspirei fundo, me sentei no sofá, olhei para a janela, para a porta de casa, meus olhos arregalados e os batimentos acelerados, mas não desisti, nem fechei os olhos. Aos poucos fui me acostumando com a escuridão e o silêncio. Nessa hora, a imaginação bateu com força. Vieram todos os monstros de uma só vez.

O ladrão escalando o prédio e entrando pela janela, o velho ensanguentado que vi na praia da Urca uma vez, minha avó, morta ao meu lado, com a boca aberta, espíritos dos filmes de terror que eu via, um corpo carbonizado que me dizia o que fazer e eu não conseguia dizer não… eles vieram e eu não corri. Foi então que minha mente resolveu me proteger, instalando flashes de pensamentos que acabavam com todas as ameaças. Minha avó sorriu pra mim e desapareceu, eu consegui impedir o ladrão de entrar em casa dando uns golpes de Bruce Lee, até ele cair da janela, o corpo carbonizado pegou fogo e derreteu, dei um jeito em todos os espíritos dos filmes, um por um, e o velho ensanguentado começou a chorar, o que me fez ter pena dele. Cada monstro que vinha, cada medo que surgia, minha imaginação criou uma cura.

Novos monstros vieram com o passar dos anos e para todos eles eu criava uma história e os vencia. Eu não tive mais medo de escuro desde aquela noite. A imaginação fez surgir todos os meus medos, verdade; mas é ela também que sempre me afastou deles.

De tanto me fazer perguntas, pensar em tantas coisas, em tantas hipóteses para tantas situações, acho que acabo me preparando de certa forma para o desconhecido, o que acaba tornando familiar uma situação que porventura eu nunca tenha vivido, e em vez de ter medo o que bate é uma tremenda de uma curiosidade. É engraçado que a mente crie tantas hipóteses e, assim como o medo, a gente resolva acreditar nelas. Acho isso terrível.

Se a gente inventa armas, acredita nelas e não sabe como se defender dos vilões que nós mesmos criamos, medo é a única voz que nossa mente vai ouvir. Nesse caso, a personagem do Hannibal tem total razão. Porém, como a do Rick Sanchez, nossas mentes são imaginativas demais pra gente só conseguir criar o medo, certo? 😉

No mais… adoro que a ideia de falar sobre imaginação tenha vindo de uma pergunta que aparentemente nada tem a ver com o assunto…

Ps. É o que tinha pra hoje, sorry, mas não é como se vocês estivessem sendo enganados, afinal, o nome aqui da minha coluna é Terapivivizando, é breguice na certa! E estou ouvindo música clássica, minha mente tá disparando aqui querendo falar também de inocência X ponderação, Batman X Coringa e muito mais, então agradeça que acabou e não reclama, senão mês que vem tem mais!)

Beijo!

#Fui

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