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Heresia

Stephanie Merritt, ou melhor, J.S. Parris, como ela assina em “Heresia”, cria um suspense passado no século XVI e que tem como protagonista o filosofo Giordano Bruno. O livro é cheio de reviravoltas e tem como mote a intolerância religiosa, tema tão em voga no em 1583 como em 2011, infelizmente. Esse debate é o mais interessante do livro que desliza um pouco na construção de sua trama.

Toda a ação é passada na Inglaterra, mas especificamente em Oxford, cidade e universidade que já era respeitada no mundo acadêmico. Giordano Bruno, já excomungado pela Igreja Católica por ousar dizer que a terra não é o centro do universo e outros conceitos absurdos para a época, vai para Oxford em busca de um livro perdido há anos e acaba se tornando um espião da Rainha Elizabeth em sua luta contra os católicos. Em sua função de espionagem, Bruno se vê como investigador de mortes sangrentas e obviamente motivadas por questões religiosas e nesse momento a história realmente começa.

A reconstituição de época, principalmente dos costumes na universidade de Oxford, é maravilhosa. A divisão entre os alunos pagantes, os professores, as regras da instituição, tudo isso colabora para a montagem do clima hostil entre católicos e protestantes. Giordano Bruno é um estranho no meio acadêmico, não é compreendido por nenhum dos grupos religiosos e isso dificulta um pouco sua missão, mas ao mesmo tempo dá ao leitor a possibilidade de presenciar boas discussões sobre a liberdade religiosa.

Como em todo o romance histórico tem de haver uma moça que por alguma razão fora dos padrões estudou e isso fascina todos os homens a sua volta, no casa de “Heresia” essa moça é Sophia, filha do diretor do Colégio Lincoln. No primeiro terço do livro se acredita que possa existir alguma coisa entre ela e Bruno, mas as circunstâncias mudam meio no terço final. Para não relevar muito, posso dizer que ela é importante para o desenrolar da história, que sua presença move Bruno a desenrolar o mistério dos assassinatos e que no fim ela é meio esquecida.

A história, mesmo com três assassinatos e uma profusão de suspeitos, caminha lentamente, ela só ganha ritmo mesmo no terço final, onde tudo acontece de uma vez só. Tenho que dizer que o enfrentamento entre Bruno e Rowland Jenkes depois da missa me deu um pouco de pena do protagonista, a emboscada é obvia demais para que alguém como Giordano Bruno pudesse cair, mas entendo que é fundamental para que algumas pistas sejam descobertas.

O que mais gostei na leitura é o debate sobre os extremos que a religião pode levar. Esse livro é repleto de extremistas, pessoas capazes de qualquer coisa pela sua fé, algo bem próximo dos homens e mulheres bomba que vemos no noticiário hoje. Os questionamentos de Bruno sobre se matar em nome da religião são ótimos, principalmente no final do livro. Esses questionamentos valem para os nossos dias onde ditaduras religiosas como no Irã ainda persistem e onde exércitos como o talibã continuam conseguindo adeptos em nome da religião. Parris mostra que em outros tempos católicos e protestantes tinham o mesmo fanatismo que alguns islâmicos têm e que cometeram atos tão violentos quanto em nome da fé que professavam. “Heresia” é uma boa leitura não pelo seu suspense, mas pelas questões que levanta, afinal a heresia suprema é a violência disfarçada de missão religiosa.

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