Coluna

Mentiras, pais e 13 Reasons Why

 

Nada melhor que começar uma coluna dizendo “terminei de escrever meu segundo livro”, então, hey, galera, terminei de escrever meu segundo livro. =D Seria um desserviço dizer a vocês que estou completamente feliz, porque a felicidade mesmo deve ocupar apenas uns 50% das minhas emoções agora. O restante eu preenchi com ansiedade, medo, empolgação, síndrome do impostor e expectativa. Então, beleza, yay, terminei mais um trabalho, vitóoooooria, mas verdade seja dita… estou me sentindo muito emotiva!!

E foi por isso que hoje decidi escrever (a coluna mais brega de todas) sobre pais e 13 Reasons Why. Mentira! A coluna de hoje é sobre mentiras, o ato de mentir, pais e 13 Reasons Why. Isso! Aproveitando o gancho das meninas que escreveram um excelente texto sobre a segunda temporada que acabou de estrear na Netflix, e sem exatamente discordar delas, porque acho a série boa, pertinente e também acredito que abrir diálogo e falar sobre suicídio pode ajudar mais que atrapalhar, decidi, porém, embora soe contraditório, começar esse texto dizendo o quanto essa série me fez mal, ainda que eu só tenha percebido muito tempo depois.

Talvez eu esteja apenas fazendo o papel de advogada do diabo aqui, pra manter uma discussão tão importante ativa, mas a questão é que depressão e suicídio são assuntos delicados de fato, e não é à toa que a própria série diz que, se você está com problemas, tem depressão ou vive um momento de crise, não deve assistir, pois ela não é recomendada pra você.

Eu nunca fui diagnosticada com depressão e, mesmo assim, saí com feridas e cicatrizes ao assistir à primeira temporada e, mesmo que não faça sentido algum pra você, vou tentar, ao longo da coluna de hoje, explicar por quê, e talvez você se identifique e decida que esse não é o melhor momento de assistir a essa série, caso ainda não tenha visto. É possível que isso seja algo que eu precise dizer mais a mim mesma que a vocês, mas resolvi aproveitar este espaço. Espero que não se incomodem.

Uma das perguntas que eu sempre me faço é “por que nós mentimos?” Não é uma exclusividade dos pais, nem dos adolescentes, nem das crianças, nem dos adultos. Todos nós mentimos. A gente acha que está se protegendo ao esconder a verdade, ou protegendo o outro, ou talvez o motivo seja apenas covardia ou manipulação, uma maneira de controlar a situação a seu favor. Seja como for, a gente sempre acha que tem uma justificativa plausível para mentir. O que a gente não enxerga é que, ao mentir, optamos por caminhar no escuro. Se não contamos a verdade, não ganhamos a chance de conhecer as consequências dela. Ficamos apenas no limbo das deduções e do negativismo. Omitir é ainda pior. A gente não apenas fica totalmente no escuro, como decide não dar nem um passo sequer.

Solidão pra muita gente está ligada a falta de conexão com outra pessoa, certo? Não sou nenhuma expert no assunto, mas é o que a vida nos mostra. E, normalmente, conexão se dá através da comunicação. Quando há uma falha ou ela não existe, nossa mente completa esse espaço com imaginação, o que temos de melhor e mais perigoso, dependendo do ponto de vista. Dito isso, basicamente, quase todos os problemas dos jovens na série 13 Reasons Why, jovens da vida real ou humanos em geral, tem a ver com essa falta de comunicação. Porque geral prefere mentir, seja pra se esconder ou pra proteger alguém, a ter que encarar o que realmente pensa e sente.

O que me leva ao próximo tópico: pais. Por que os pais acham que, ao mentir ou esconder a verdade, estão protegendo seus filhos? Não faz nem sentido. Quando os filhos percebem que os pais estão mentindo, eles não se sentem protegidos, sentem, na verdade, que os pais não confiam que eles são fortes o suficiente para lidar com aquela informação. Às vezes, acho que os pais se esquecem de como eram quando adolescentes e ficam tão cegamente preocupados que agem de forma radical para proteger as crianças, mas no fundo as afastam ainda mais. Sempre fico meio confusa quando vejo um pai ou uma mãe impedindo o filho ou a filha de fazer algo que demonstrou interesse em fazer, porque “ainda não é hora”. Ainda não é hora pra quem, amigos?

As pessoas não se desenvolvem de forma idêntica. Cada um tem seu tempo para aprender seja lá o que for. Na psicologia, quando um indivíduo faz uma pergunta e se mostra interessado em saber mais sobre algum assunto, deve-se respeitar e nutrir a curiosidade, não inibi-la. Aliás, chegamos no ponto que eu queria. É justamente porque precisamos respeitar nosso tempo de aprendizado que essa série (e qualquer outra obra de ficção, na verdade, que trate sobre esses assuntos delicados) pode ser prejudicial para muitos.

Às vezes, não estamos preparados para entrar em contato com algumas coisas e, ao forçar a barra do nosso consciente para um assunto tão invasivo, negativo e destruidor, podemos acabar fazendo mais mal do que bem. Por isso que, no ramo da psicologia e psicanálise, o profissional deixa o paciente o mais à vontade possível para encontrar as lacunas e as portas por conta própria, respeitando seu momento de descoberta.

13 Reasons Why não fala apenas de suicídio e depressão. A série aborda temas como abuso psicológico, estupro, bullying, abuso moral, abuso sexual, machismo, misoginia, racismo, violência, drogas e, sobretudo, mentiras. De todos os tipos. Imagino que todo mundo possa se identificar com ao menos um desses temas ou todos, para os menos privilegiados. O problema é quando você não está preparado para refletir mais sobre eles, ir a fundo e descobrir coisas sobre outros e sobre você mesmo que ainda não estava preparado para descobrir.

Não estou dizendo que esse efeito negativo é universal, nem uma exclusividade da série 13 Reasons Why e nem que outras séries e filmes não possam ser também um gatilho para muitas pessoas, apenas que, neste caso, a carga dramática e a explicitude, além de focar na vida de adolescentes e não adultos, contribuem para ela atingir as pessoas com mais potência que outras obras que abordam os mesmos assuntos mas optam por um tom mais leve.

Por fim, que fique claro que não estou aqui para pregar boicote à série, até porque estou assistindo à segunda temporada (depois de muito pensar sobre e decidir que estou preparada) e já estou no oitavo episódio, hehehe. É uma série realmente muito boa. Só quis trazer à discussão uma outra visão e lembrar que o que a gente assiste pode ter sim um grande impacto nas nossas vidas, ainda mais dependendo do que estamos passando, e que devemos sempre ter cautela na hora de indicar uma série sobre suicídio a alguém, principalmente quando você não sabe se essa pessoa está preparada pra ver aquele conteúdo.

#Fui

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