Coluna

Teoria da pizza literária

Eu não tô bem, não.

Ultimamente ando pensando em fatias de pizza como partes de uma história e, mais ainda, a pizza como uma analogia ao ciclo da vida e, cara, isso não é normal. Ou eu tô com muita fome de pizza ou eu tô pirando de vez e preciso de ajuda profissional, mas acho que vamos descobrir ao fim do post, caso ninguém compreenda e queira me internar. Por ora, eu os convido a sacrificar alguns minutos do tempo de vocês para raciocinar a teoria da pizza literária aqui comigo. Antes, apenas um detalhe: leve em conta uma pizza individual do tamanho que vocês costumam comer, dividida em quatro pedaços, ok? Vamos lá.

Você tá morrendo de fome, entra na pizzaria, pede a pizza de sua preferência e espera ansioso ou ansiosa pelo momento de pura felicidade quando dará a primeira mordida. Beleza. A pizza chega.

Primeira fatia:

Você a coloca no prato, depressa, corta o primeiro pedaço e o enfia logo na boca, doido pra sentir o sal e a gordura do queijo e do recheio em questão. Mastiga mais rápido, ávido, voraz, termina a primeira fatia em poucos minutos. Vamos ser sinceros aqui, quando termina essa primeira fatia, apesar de ainda lembrar do gosto especial que ela teve e ainda poder senti-lo de leve na boca, você não vê a hora de devorar o segundo pedaço, certo? Então. Esse é o começo da sua história: pizzinício.

Na vida é a infância; o sabor está nascendo em você, os prazeres estão sendo desenvolvidos e você está com fome de conhecimento, olha para tudo, pergunta tudo, quer sentir tudo ao mesmo tempo, mas não compreende nada, porque passa rápido e quando se dá conta esse momento acabou, e tudo que lhe resta para enfrentar a segunda etapa são algumas poucas memórias. Na literatura é o início da história e tudo o que acabei de dizer sobre a infância se aplica aos primeiros capítulos, independentemente de onde tiver começado a história em questão. Isso vale para o conto, para o leitor e para o escritor. No início, no primeiro pedaço de pizza, todo mundo saboreia como se estivesse comendo/vivendo aquilo pela primeira vez na vida.

Segunda fatia:

Agora você está mais preparado para o gosto que vai sentir. Na verdade, você não está apenas preparado como acha que já conhece tudo sobre a pizza. Essa etapa se chama pizzadolescência. Na vida é quando você sofre as primeiras desilusões, seja com família, amigos ou no romance, afinal, uma pizza pode ser familiar e do nada trair suas expectativas assim como as pessoas. E por conta disso você acha que sabe tudo e que nada mais no mundo pode te surpreender, afinal, você sabe mais que ninguém por onde é melhor começar a mastigar, onde está mais macio, sabe o gosto da casquinha e se você a quer comer ou não, sabe onde se encontra os dissabores e a parte não tão gostosa assim e, o principal, você não tem mais tanta pressa em devorar seu caminho até a etapa seguinte, porque está preocupado demais em questionar a existência da casquinha e se comê-la é ou não o melhor custo-benefício. Na literatura, é quando você começa a entender melhor os personagens e percebe que eles também têm defeitos ou dúvidas e não são criaturas perfeitas e, ao questionar o que faria no lugar deles, você logo deduz, julga e cria teorias para o desenrolar de suas vidas e ingenuamente acha que já sabe tudo. Você saboreia, vive momentos púberes e intensos, mas não percebe o quanto está sendo arrogante com a pizza/vida/livro.

Terceira fatia:

Essa é a minha favorita. Pizzápice ou pizzauge, como queira. Agora que você não tem mais pressa nenhuma, muito pelo contrário, pois gostaria de desacelerar o tempo, pode saborear cada mastigada e finalmente colher os efeitos do que já foi comido. Independentemente se a expectativa em relação ao recheio foi atingida ou não, você está bem perto de alcançar a satisfação, pois seu corpo já está sentindo as consequências e o peso de tudo. O peso da escolha do sabor da pizza, do restaurante, do tipo de comida para o momento… Você absorve de forma mais consciente o que está em jogo, mas não de forma arrogante e sim humilde, porque entende que, não importa o quanto você já conheça um sabor, sempre pode se surpreender. E o mais importante e que toma conta de você completamente: a noção incrível de que você não é o único a viver tantas emoções com sua pizza e, desse momento em diante, você se transforma; até mesmo sua pizza, embora pareça a mesma de antes, ganha um novo sabor. Na verdade é seu paladar que muda, mas a gente adora pensar que é a pizza/vida que resolveu dar uma guinada, virou do avesso ou, como os mais tradicionais dizem, “sofreu uma repaginada”, dependendo da carga das suas mudanças, se são negativas ou positivas. Afinal, nem toda pizza é maravilhosa, não é mesmo? De qualquer forma, tanto na vida quanto na literatura, essa etapa nos carrega para um momento de conhecimento, lucidez e experimento. Cada mastigada é uma aventura rumo ao amadurecimento.

Quarta e última fatia:

A famigerada e subestimada pizzeiridade. É bem verdade que aqui você já está quase satisfeito. Você se questiona se fez a escolha certa de sabor e imagina o sabor das outras pizzas, você respira fundo entre as investidas e mastigadas, está cansado de comer, mas, ao mesmo tempo, está tão apegado à pizza que não consegue parar de ingerir até que não haja mais nada no prato. Na vida e na literatura, amigo, esse é o ponto sem volta. Você olha para o último pedaço da pizza e decide como prefere encará-lo. E, então, somente então, de forma alguma antes disso, você finalmente descobre se sua pizza favorita era realmente aquela de quatro queijos ou margherita… porque só depois mesmo dos quatro pedaços para você entender de uma vez por todas o que realmente gosta. E, por último, se você escolhe ou não, ao terminar a pizza, colocar a mão na barriga, satisfeito, e sorrir, depende inteiramente e apenas de você.

É a lógica de um ritual. Faz sentido, vai! Dá até pra usar com outras comidas! O que vocês acham?

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