Publicado em 1988, e relançado pela editora Record este mês, “O Pêndulo de Foucault” é um clássico de Umberto Eco, renomado autor italiano, para o qual vale a pena dar uma chance.
Vamos começar pelo início: Eu curto muito Umberto Eco, mas enquanto autor ficcional sua escrita não é nada fácil. Na academia já estamos acostumados a essa “soberba literária”, mas na literatura nem todo mundo está disposto a continuar quando pega um livro assim. Rebuscado, exageradamente detalhado, algumas vezes até cansativo. É o tipo de autor “ame-o ou deixe-o”, não dá pra encarar as centenas de páginas de “O Pêndulo de Foucault” apenas para passar o tempo, é uma leitura que dependendo do que você gosta e do momento em que está, pode até bugar um pouco o cérebro. Se você nunca leu nada do autor, recomendo começar pelo “O Nome da Rosa”, é um livo maravilhoso, você ficará ambientado ao estilo do autor, e é uma trama bastante mais palatável.
A sinopse é até bastante curta: “Causabon, Belboe Diotallevi são redatores da editora Garamond, na Milão do início dos anos 80. Cansados da leitura e releitura de incontáveis manuscritos de ciências ocultas, eles acabam encontrando os indícios de um complô que teria surgido em 1312- quando Felipe, o Belo, supriu a Ordem dos Templários- e atravessando, oculto, toda a historia do planeta até o final do século XX. Os agentes e beneficiários do complô, seriam os templários e os rosas cruzes, cujo o objetivo era dominar o mundo. A partir deste plano, os três redatores inventam, como uma brincadeira, uma trama fantasiosa. Mas o inesperado acontece e alguém começa os levar a sério.”
Esse “Plano” desenvolvido por eles envolve basicamente todas as sociedades secretas das quais eu já ouvi falar no mundo e vários detalhes dos mais diversos séculos de história mundial, e acaba se mostrando como uma ameaça real. Para quem gosta de ter acesso as mais variadas informações históricas, teorias da conspiração e trechos de livros raros, “O Pêndulo de Foucault” é um prato cheio. O tipo de livro que faz você ter vontade de ficar fazendo anotações num bloquinho pra não perder nada. O ponto negativo (pode ser positivo, para alguns) é a arrogância com a qual Eco passa pelas temáticas, usando sempre um tom que diminui tudo que é ligado ao misticismo, quase que caçoando de quem acredita em aspectos ligados à magia, ocultismo ou outras áreas semelhantes. Acadêmico de renome, o próprio autor admite que o livro é uma espécie de metáfora, quase chacota, dos colegas ao seu redor que de tanto ler sobre estes assuntos passam a ver teorias da conspiração e sinais claros de que o ocultismo é real, por exemplo, coisas que, segundo ele, não deveriam ser levados a sério.
A semelhança da trama com os bestsellers de Dan Brown é inegável, porém, se em Brown percebemos desde o início o ritmo alucinado que nos faz imaginar quase que imediatamente os personagens em uma tela de cinema, com Eco é tudo mais arrastado, sobrecarregado de informações minuciosas, e esta, paradoxalmente, é a maior força do livro. Todos os contextos do “Plano” são tão milimetricamente explicados que você começa a duvidar se todas as teorias sobre essas organizações secretas não são reais. Sobre essa semelhança-diferença com as atuais tramas cinematográficas como “O Código da Vinci”, Umberto Eco declarou (em seu tom nada humilde):
Eu inventei Dan Brown. Ele é um dos personagens grotescos do meu romance que levam a sério um monte de material estúpido sobre ocultismo. O Pêndulo de Foucault projeto brinca com teorias conspiratórias e teve início com uma pesquisa entre 1.500 livros de ocultismo reunidos por seu autor. Ele [Dan Brown] usou grande parte do material.” Em ‘O Pêndulo de Foucault’, eu havia inserido um bom número de ingredientes esotéricos, que podem ser encontrados no Código Da Vinci. Os meus personagens, ao elaborarem os seus projetos, levam em conta a importância do Graal, por exemplo. Eu quis fazer uma representação grotesca daquilo que eu via em volta de mim, de uma tendência da qual eu previa o crescimento. Era fácil fazer uma profecia como esta. Ao pesquisar para escrever ‘O Pêndulo de Foucault’, eu esvaziei todas as livrarias que já se especializavam nessa “gororoba cultural”. Dan Brown copia livros que podiam ser encontrados trinta anos atrás nos sebos da Rue de la Huchette, em Paris. O sucesso pode ser explicado pelo fato de que os autores desses best-sellers levam tudo isso a sério, e ainda pelo fato de que as pessoas são sedentas por mistérios.
E dá pra curtir Dan Brown e também curtir Umberto Eco? Olha, de minha parte dá sim. Mas é preciso ter em mente que são duas leituras absolutamente diferentes. Se “O Código da Vinci” pode te conquistar desde o começo por sua leitura fácil e fluída, “O Pêndulo de Foucault” pode repelir os leitores menos persistentes, porque é lá pelo meio, quando os conspiradores estão escrevendo o “Plano” que tudo começa a ficar mais atrativo e te faz ter vontade de ler mais um pouquinho para saber qual informação você poderá absorver na página seguinte, desde a maçonaria, passando pelo nazismo, até os matadores de “Assassin’s Creed”.
Acredito que seja o livro de ficção mais bem embasado historicamente que já li, mas, reitero, o desdém com que Umberto Eco trata o ocultismo, a magia e assuntos afins, como não ciência ou sub-ciência, pode irritar muitos leitores por aí. É interessante perceber, também, que o livro trata de como criações podem tomar vida e como até seu inconsciente pode te pregar umas peças. “O Pêndulo de Foucault” não tem personagens absolutamente marcantes, longos romances, ou cenas de ação cinematográficas, porém é uma trama bastante cética sobre sociedades secretas e teorias da conspiração, para quem curte o gênero, é um livro necessário, um clássico imperdível.
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