No dia do escritor, Vivi Maurey conta sobre seu processo criativo (a inexistência dele) e como foi crucial para o desenvolvimento da sua escrita trabalhar com o texto.
Quando alguém me pergunta: Vivi, qual é o seu processo criativo? Respondo: Eu sento e escrevo.
Sei que parece um tanto pedante, mas vou tentar explicar melhor. Eu não tenho muito essa coisa de processo criativo, sabe? Desenhar outline, pensar no final, estruturar os capítulos… já tentei fazer tudo isso. Acho até MUITO importante todas essas etapas. Principalmente quando escrevo romance (já escrevi dois e sem etapas jamais teria conseguido terminar as histórias). Mas, como no dia a dia escrevo contos, a única coisa que faço (e prefiro fazer) é sentar e escrever.
Isso é bom? É o certo? Não faço ideia. Mas funciona comigo.
Tem autor que organiza TUDO e pensa em TUDO, acho lindo, mas eu costumo dizer que psicografo de tão “espontâneo” que é meu ato de escrever. Lá no início, quando comecei a escrever contos, achava que sair escrevendo qualquer coisa era sinônimo de amadorismo. Eu não podia estar mais enganada. Dessa forma, destravei muitos bloqueios que eu nem sabia ainda que existiam e, justamente por ter me dado uma liberdade infinita, aprendi a lidar com a quantidade enorme de caminhos que a escrita espontânea me proporcionava. Acho que fui forçada a amadurecer.
O “estruturar” me atrapalha e me faz perder o tesão na história, por isso prefiro não saber nem o final enquanto escrevo para que eu, como leitora do meu próprio texto, me surpreenda ao fim. É meio louco, eu sei. Mas talvez isso faça mais sentido com o que vou dizer agora…
Nem sempre o “psicografar” foi algo fácil para mim. Eu li muitos livros de autoajuda pra escritor e fiz muitos exercícios de tudo quanto é tipo que você possa imaginar. Brinquei e desbrinquei com as minhas histórias. Foi tudo uma delícia. Peguei ficha de personagem dos jogos de RPG para preencher, ficha de personagem do programa de escrita Scrivener, brinquei de fazer perguntas aleatórias pros protagonistas e antagonistas para ver o quanto eles eram diferentes ou parecidos, enfim… coisa de esquizofrênico mesmo. Não existe escritor de verdade que não sofra algum tipo de esquizofrenia, vamos combinar. Fiz de tudo e tinha muita dificuldade para simplesmente sentar a bunda e começar a escrever.
Então… tudo isso mudou quando comecei a trabalhar com textos. Lá em 2008, nos meus primórdios de trabalho em editora, ainda no Marketing, eu comecei a pegar frila de texto. Revisão, preparação de texto original, tradução de uma coisa ou outra… peguei uns livros estrangeiros também para escrever parecer. Depois de uns anos fazendo isso, principalmente depois que comecei a trabalhar no editorial e me tornei editora, você acaba amadurecendo E MUITO o próprio texto. Trabalho com linguagem há muito tempo! É lógico que isso acabou influenciando minha escrita.
Portanto, quando digo que psicografo, anos e anos de trabalho com texto estão implícitos em cada palavra que coloco no papel. Não acho nem de perto que eu tenha alcançado ainda o nível de fluência que estou buscando, mas sem dúvida o que eu tenho hoje de facilidade se deve ao fato de ter respirado por tanto tempo esse mundo editorial. Então, não é questão de ter mais ou menos facilidade para escrever sem organização. A linguagem é tipo uma melhor amiga de muitos anos… eu sei o que ela gosta e espera de mim.
Dito isso… não acho que isso seja uma regra.
Stephen King é fluente e escreve um livro inteiro por ida ao banheiro. Sério. Ele caga e CAPLOFT sai um livro de terror maravilhoso! George Martin é tão fluente quanto ele, mas não consegue escrever rápido. Se bem que com tantos personagens, seria impossível pro Martin “psicografar”.
A questão é: pelo menos, para escrever contos, eu sento e as palavras simplesmente fluem para o papel. Ao abraçar a espontaneidade parece que atinjo um nível ainda maior de fluidez. É muito doido. Mas eu sou maluquinha mesmo… o que se pode fazer?!
Moral da história: não tem. Você pode escrever de um jeito ou de outro, só quem vai saber se funciona ou não é você, depois de tentar.
Aproveita que é dia do escritor e tente um exercício pequeno agora… dê voz ao objeto mais próximo de você e escreva 10 linhas sobre ele, como se ele estivesse querendo te contar um segredo. Faça isso de forma espontânea, escreva o que der na telha e não pense duas vezes. Liberte-se! 😉
Boa escrita e feliz dia do escritor!