O menino de óculos, olhos verdes, cabelo desarrumado e raio na testa… Aquele que sobreviveu. E morreu. E sobreviveu de novo. O garoto desengonçado que mais conquistou o coração de várias gerações.
Hoje inauguramos uma nova sessão no Cheiro de Livro. Terça sim, terça não, desencavaremos do fundo da nossa memória um livrinho cheirando a naftalina, meio amarelado pelo tempo, mas que nos marcou de alguma forma. A idéia não é relê-lo, e sim utilizar mesmo o que dele ficou gravado na nossa massa cinzenta, e, especialmente, na nossa vida (hoje tô profunda).
E é com muita felicidade e uma pontada de pesar que o primeiro livro (ou melhor, série de livros) que me veio à cabeça foi Harry Potter. Digo que tem uma pontada de pesar por apenas um motivo: percebi o quanto estou velha. Quando, num primeiro momento, pensei em HP para essa seção, meu pensamento imediato foi: “Ora, não faz tanto tempo assim que eu li Harry Potter…” e então veio aquele momento: “OH, WAIT! Fazem 14 fucking anos que li o primeiro livro!”. Então, se você também foi uma criança Harry Potter, aceite essa realidade comigo: a escola acabou, a faculdade provavelmente também (eu já conclui até a pós-graduação!), e A NOSSA CARTA DE HOGWARTS NÃO CHEGOU! #TodosChora ao se lembrar.
Sim, porque eu comecei a ler HP aos 10 anos e, quando completei 11, estava lá eu, esperando a bendita da coruja trazer a minha carta pro mundo perigosamente divertido da magia. E eu nem nunca tinha visto uma coruja de perto! Óbvio que a carta não chegou, e óbvio que eu expliquei o fato dizendo pra mim mesma que “Não tem Hogwarts no Brasil”. Ao ler “Harry Potter e o Cálice de Fogo” e descobrir que existiam escolas de magia no mundo inteiro, meu mundo caiu. Confesse, você também passou por esse sentimento.
Enfim, eu fui uma daquelas crianças chatas que colecionava mil coisas do universo HP, que reservava os livros antes de eles serem lançados (sim, porque quando eu comecei a ler só existiam os TRÊS primeiros volumes no Brasil! E vamos lembrar, minha gente, são SETE!), que ia ao cinema acompanhar os filmes na estréia e ficava sempre implicando com várias cenas (ou a falta delas): “no livro não é assim!”. Eu acho que Harry Potter tem tudo aquilo que uma série de sucesso precisa: aventura, humor, romance, conflitos, um tanto de suspense e uma pitada de mistério, aquela duvidaziha que sempre fica pro próximo livro. São ótimos livros para se ler na infância / adolescência, pois tem várias “morais da história” sem, contudo, tratar a criança como idiota, como muita história faz por aí. Com HP eu aprendi que quem é pobre pode ser o mais rico, e que quem é rico pode ser o mais pobre. Que se deve confiar nos amigos e perdoar os inimigos. Que as aparências enganam, e que não devemos julgar alguém sem realmente conhecê-lo. Aprendi a lidar com perdas e sofrimento, e a ter uma outra visão sobre a morte. E, é claro, que livros com mais de 500 páginas podem ser MUITO legais!
Crescer junto com um personagem foi edificante pra mim. E, apesar de recomendar a série a todos, sei que essa experiência de ter que aguardar o lançamento dos livros seguintes, e ter mais ou menos a mesma idade do Harry enquanto eu e ele íamos crescendo, fez uma enorme diferença na minha experiência de leitura. É algo que não vai se repetir. Já li e reli todos os livros da série incontáveis vezes. E cada vez é uma leitura diferente.
Hoje estão todos os sete (além dos livros “extras”), bonitinhos, enfileirados, na minha estante. Sempre cresço o olho quando lançam edições de colecionador, mas não troco as minhas edições gastas, amareladas, e com o metalizado das letras “Harry Potter” completamente gastos, POR NADA. Eles fazem parte da minha vida.
Um dia, lerei para os meus filhos. Ou melhor, vou deixar que eles mesmos leiam.
E se me perguntarem: “Depois de todo esse tempo?” eu direi: “Sempre.”.
PS.: Eu PRECISAVA dizer que essa última frase foi uma homenagem ao meu personagem favorito, Severus Snape (como se essa citação não tivesse ficado famosa o suficiente pra vocês saberem que é dele…). Vocês vão dizer “bullshit, todo mundo diz isso depois que leu o último livro”, mas minha consciência está tranquila: Eu amei e confiei no nosso querido (e odiado) ranhoso desde o início.