O menino corre descalço na beira do lago em Waukegan, Illinois. Em sua sua cabeça, está a milhões de quilômetros dali, em Barsoom, também conhecido como o planeta Marte. Em sua cabeça, está saltando em aventuras fantásticas com John Carter. Ou voando com Buck Rogers, como nas tirinhas que recortava do jornal. Até que, pressionado por colegas da escola que não sonhavam como ele, o menino chega a jogar fora sua coleção tão preciosa. Mas logo se arrepende e recomeça a coleção que vai guardar até o fim da vida.
O menino Ray atravessa o país durante a Grande Depressão, como personagem de seu futuro ídolo John Steinbeck. Vai parar na Califórnia, vendendo jornais na esquina e batendo na porta dos estúdios de Hollywood. A paixão pelo cinema era antiga, levado pela mãe para ver O Corcunda de Notre Dame e O Fantasma da Ópera, com Lon Chaney.
Não é nas universidades que encontra o conhecimento que busca, e sim nas bibliotecas. Aprende sozinho, devorando livros. Assim como tinha aprendido a ler com os quadrinhos nos jornais.
Conhece outros meninos, sonhadores futuristas como ele. E começa a compartilhar os sonhos, escrevendo. Nas suas histórias, sempre enxerga o fantástico, o bizarro, o maravilhoso na vida cotidiana. Volta muitas vezes à infância e transforma Waukegan numa Green Town com personagens estranhas e sobrenaturais. Às vezes assustadoras, às vezes famílias de monstros simpáticos. Também pudera, para alguém que teve uma antepassada condenada como bruxa…
Sonha com o planeta vermelho e torna-se o cronista de Marte, não aquele planeta árido e frio, mas um lugar que reflete e espelha o que os colonizadores humanos levam com eles – tanto para o bem quanto para o mal.
Quem sonha também tem pesadelos, como o de um futuro distópico e opressor em que nos alienamos e queimamos os livros e com eles o conhecimento a 451 graus Fahrenheit. Ou o terror de um parque de diversões que esconde algo sinistro por trás de um carrossel com o poder de tornar alguém mais jovem. Viaja no tempo, e ao som do trovão descobre que as coisas mais insignificantes podem ter consequências devastadoras.
E de Espaço, F de Foguete, e B de Bradbury, que como um de seus personagens permanece sempre jovem, sempre um menino, sempre sonhando.
Outro lugar, outra época, e um certo menino de 12 anos descobre um livro. Nele, um viajante encontra um homem com o corpo coberto de tatuagens. Não consegue desviar o olhar, e parece ver as ilustrações se movendo, cada uma começando a contar uma história… O menino começa a ler uma história atrás da outra, e não para mais.