H.P. Lovecraft (1890-1937) é um escritor que entra e sai de moda, e parece que nunca foi tão debatido quanto agora. Nos últimos anos discutiu-se muito o racismo evidente em algumas das obras dele; os organizadores do World Fantasy Award mudaram a estatueta do prêmio depois que vários escritores negros manifestaram o desconforto de ter um busto do escritor na prateleira. Alguns críticos chegam ao ponto de sugerir que ele merece ser relegado ao esquecimento. Outros, como Victor LaValle, que é negro, entendem que não dá pra simplesmente apagar a importância de Lovecraft. Preferem reconhecer, tentar entender, e encontrar outras formas de lidar com esse racismo. O resultado tem sido uma safra de obras que tentam reler e reimaginar ideias e histórias de HPL.
A Balada do Black Tom (Morro Branco, trad. Petê Rissati), de LaValle, retoma uma das histórias com maior teor racista (e também uma das mais fracas) de Lovecraft, O Horror em Red Hook. Nela, um detetive se envolve com um culto sinistro numa área do Brooklyn povoada por imigrantes e mestiços que Lovecraft descreve da maneira mais pejorativa possível. LaValle subverte a narrativa, com a introdução Charles Thomas Tester, um músico de Jazz que vive de pequenos golpes para sobreviver e sustentar o pai. Ele é contratado pelo milionário recluso Robert Suydam (o vilão da história de Lovecraft) para tocar numa festa muito esquisita. Logo se envolve também com o policial da história original, e com o culto aos Antigos. Mas não pensem que é só um exercício literário: funciona como história de terror, arrepiante e divertida, ao mesmo tempo em que faz comentários sobre o racismo e as desigualdades nos Estados Unidos. Está sendo desenvolvido como série pela AMC/Syfy.
O livro de LaValle é talvez o melhor, mas é apenas a ponta do iceberg de uma série de releituras de Lovecraft. Matt Ruff faz coisa parecida em Lovecraft Country, em que um veterano de guerra negro procura o pai sequestrado por um culto na Nova Inglaterra de Lovecraft.
Paul La Farge explora a amizade entre Lovecraft e um jovem fã homossexual em The Night Ocean (título também de um conto escrito por HPL e pelo rapaz, Robert Barlow).
Em The Dream Quest of Vellit Boe, Kij Johnson revisita À Procura de Kadath, uma história da linha de viagens em sonhos de Lovecraft, só que agora com uma protagonista mulher.
A ausência de personagens femininas em Lovecraft é reparada em Dreams from the Witch House, que reúne escritoras com o Joyce Carol Oates, Caitlín R. Kiernan, Elizabeth Bear, Nancy Kilpatrick, Molly Tanzer e Gemma Files.
E Ruthanna Emrys conta a história dos sobreviventes dos adoradores de Cthulhu e Dagon do clássico A Sombra de Innsmouth, em Winter Tide e Deep Roots, também com um olhar feminino.
Todas obras interessantíssimas e com valor próprio, que contribuem para a discussão de Lovecraft e seus problemas
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