Garota Exemplar é um daqueles raros casos de um livro muito bem adaptado para o cinema (leia a resenha do livro), um dos casos em que tanto o livro como o filme se sustentam por si só. É uma história sobre aparências e David Fincher consegue contá-la com maestria.
Colabora e muito para a boa adaptação o fato de o roteiro ser de Gillian Flynn, a autora do livro. Ela cortou partes que no livro são essenciais, mas que na transposição para a tela seriam gorduras desnecessárias. Fez também um mea culpa, ao perceber que a parte final do livro é um tanto rocambolesca; no filme ela ouviu os críticos e deu um fechamento mais redondo. Não é um final diferente, como chegou a ser anunciado em entrevistas, é apenas uma forma diferente de contar o que aconteceu, e para a linguagem do cinema funciona muito bem.
Ben Affleck não é um grande ator — ele tem apenas umas quatro expressões faciais —, mas isso é perfeito para o papel. Seu Nick, meio perdido em um casamento que desmorona, sem emprego e com a mulher desaparecida, está no tom certo. Atenção para o figurino, ele contribui para mostrar a evolução de Nick, a sua luta pela sobrevivência em uma trama de aparências.
Affleck funciona também como escada para a grande estrela do filme: Rosamund Pike. Ela constrói uma Amy maravilhosa, no tom certo em todos os momentos do filme. Sem dar spoilers, vamos apenas dizer que Amy tem dois momentos de transformação grandes no filme, e nesses dois momentos Pike segura as mudanças drásticas de maneira impecável. Mas o que chama mesmo atenção é a sutileza com que ela conduz a personagem, as pequenas dicas, os olhares, os trejeitos. Ela rouba cada cena em que aparece. Inclusive, a cena que revela Amy é a que envolve uma certa jogadinha no cabelo — e não falarei mais do que isso.
Apenas uma boa história e um bom elenco nem sempre garantem um bom filme. O diretor também é um elemento essencial. David Fincher deixa sua marca visível no filme. Ele aplica seu ritmo e visual característico a uma narrativa sobre aparências e as histórias que contamos quando queremos manter as aparências — inclusive para nós mesmos —, mantendo o clima da trama sempre cercado de um suspense intrigante. Para o caso de Garota Exemplar é um estilo que funciona com eficiência absurda — eu diria até, doentia.
Em suas mãos, um livro incrível se transformou em um filme incrível. Não vai decepcionar os fãs do best-seller, vai jogar uma luz brilhante sobre o talento de Rosamund Pike e ainda é bastante provável que consiga algumas indicações importantes na temporada de prêmios.